Ao longo dos anos, cada vez mais casais estão optando por não ter filhos. Seja pela grande responsabilidade que os filhos trazem, por não desejarem ter sua liberdade reduzida, por questões financeiras ou mesmo por não gostarem de crianças, essa opção tem sido cada vez mais comum.
O movimento ganhou o nome de “child-free”, que em uma tradução livre seria algo como “livres de crianças” ou “sem crianças”. Ele se refere a pessoas que, voluntariamente, escolhem não ter filhos. Esse termo e essa escolha não são novidades, mas nos últimos anos as pessoas estão falando mais abertamente sobre o assunto.
Por que não ter filhos?
Os motivos que podem levar alguém a não desejar ter filhos são os mais diversos, afinal, cada um deveria ser livre para fazer as escolhas que julgam melhores para suas próprias vidas. No entanto, algumas motivações são comuns entre pessoas que tomam essa decisão.
Principalmente após a pandemia do coronavírus e a crise econômica que veio com ele, as questões financeiras passaram a ter um peso grande na escolha de ter ou não filhos. Educação e saúde de qualidade, e mesmo as despesas básicas de vida, custam caro e devem ser consideradas.
Um estudo do Pew Research Center realizado em 2021 identificou que 9% das pessoas que não têm filhos afirmaram que “a situação do mundo” era a razão pela qual eles provavelmente não seriam pais. Além disso, 5% mencionaram preocupações com o meio ambiente e as mudanças climáticas.
Os impactos da decisão de não ter filhos
Ainda que mais pessoas estejam falando abertamente sobre o assunto, existe um forte julgamento em cima de quem toma a decisão de não ter filhos.
Uma matéria recente da BBC News trouxe à tona o tema, juntamente com a reflexão de que, por mais que o movimento esteja crescendo, pesquisadores argumentam que a aceitação social e a compreensão da decisão de viver sem filhos não vêm aumentando na mesma velocidade.
Se você é uma das pessoas desse grupo, tenho certeza de que já ouviu comentários como “quem vai cuidar de você quando ficar mais velha?”, “você nunca vai saber o que é amor de verdade, se não tiver filhos”, “você vai se arrepender, quando for tarde demais”. Isso porque o estigma de que pessoas que escolhem não ter filhos são egoístas e infelizes ainda é muito forte.
A vida das mulheres que escolhem não ter filhos
Não dá para negar que o estigma e o julgamento sobre a decisão de não ter filhos recai muito mais sobre a mulher.
Elizabeth Hintz, professora de comunicação da Universidade de Connecticut que estudou a percepção sobre a identidade das pessoas “child-free”, identificou que essas críticas costumam ter um forte viés de gênero. Afinal, tomar “decisões reprodutivas” sempre foi um encargo imposto muito mais às mulheres.
“A maternidade e a feminilidade estão tão intimamente entrelaçadas que, eu acho, isso também é uma parte da questão.”, afirma ela. Segundo a professora, isso acontece porque as mulheres ainda sofrem muito mais pressão do que os homens para formar uma família “tradicional”.
A psicoterapeuta Margaret O’Connor também levanta o ponto de que, diferente de uns anos atrás, hoje muito mais mulheres trabalham fora, e têm muitas responsabilidades dentro e fora de casa. “As mulheres com quem trabalho estão realmente considerando o impacto da gravidez e do parto, além da sua capacidade de se dedicar da mesma forma que elas desejam, física e mentalmente”, afirma O’Connor.
Controvérsias sobre o movimento child-free
Apesar do cerne do movimento child-free se concentrar na liberdade de escolha de ter ou não filhos, existem polêmicas vindo de um pequeno grupo mais extremista de pessoas. Isso porque alguns estabelecimentos, como hotéis e restaurantes, vem proibindo a entrada de crianças, para criar “zonas silenciosas” para quem não gosta de crianças.
O assunto gera controvérsia e diferentes interpretações, mesmo sob o ponto de vista da lei. A advogada Fabiola Meira, doutora em direito das relações de consumo e professora da PUC-SP, por exemplo, defende que “locais privados podem adotar um modelo de negócios para um público diferente, com base na livre iniciativa”.
Já Isabella Henriques, representante do instituto Alana, organização de defesa dos direitos infantis, considera que a atitude é discriminatória. “O fato de um estabelecimento ser privado não o exime de ter de cumprir a Constituição, que em seu artigo 5º diz que todos são iguais perante a lei, e que no artigo 227 diz que crianças e adolescentes têm prioridade absoluta”, afirma Henriques.
No entanto, vale lembrar que essas polêmicas não representam todos do movimento child-free.
A livre escolha
No final das contas, é importante lembrar que cada um deve ser livre para tomar suas próprias decisões e não deve sofrer represálias por elas. Não ter filhos é uma escolha individual ou do casal, e deve ser respeitada.